PROFESSOR POMBALENSE ABRE O JOGO E REVELA O DRAMA DE TER ENTRADO PARA O MUNDO DAS DROGAS E DA RECUPERAÇÃO
Aos quarenta e dois anos e em pleno processo de recuperação da dependência química, o professor universitário José Romero Araújo Cardoso (foto) é graduado em Geografia pela Universidade Federal da Paraíba (UFPB), especialista em Geografia e Gestão Territorial, e Organização de Arquivos, além de Mestre em Desenvolvimento de Meio Ambiente.
Paraibano, natural de Pombal, José Romero é muito ligado ao meio cultural, possui muitos livros publicados e é membro de algumas entidades no segmento.
Em entrevista ao jornal "O Mossoroense", o professor falou sobre seu envolvimento com as drogas, os problemas enfrentados em decorrência do vício e da decisão de mudar de vida, partindo de uma transformação espiritual.
ABAIXO, A ENTREVISTA:
O Mossoroense: O senhor está em um processo de recuperação, enfrentou alguns problemas devido ao envolvimento com drogas. Como tudo começou?
José Romero Araújo Cardoso: Sou muito envolvido com o mando cultural. Sou escritor, tenho muitos livros publicados e milito em diversas instituições culturais no Rio Grande do Norte e na Paraíba, como o Instituto Cultural do Oeste Potiguar (Icop), como a Associação Paraibana de Imprensa. E no meio cultural é muito comum algumas pessoas usarem de forma irresponsável alguns tipos de droga. Então eu comecei a fumar maconha a partir do contato com alguns intelectuais paraibanos.
O uso da maconha se estendeu até 2010, quando em razão de um trauma profundo, um problema existencial que ainda estou vivendo, um problema emocional grave que culminou exatamente na minha separação, eu comecei a usar crack, fumando sofregamente na lata. Isso daí me causou danos profundos e quando eu notei que estava morrendo eu pedi ajuda a Deus, que me enviou um colega meu da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte (Uern), agora aposentado, chamado Anselmo Rodrigues da Costa.
A partir da ajuda de Anselmo, eu tomei a decisão de buscar me recuperar em uma Fazenda da Esperança (fotos abaixo). A unidade da fazenda que fica em Serra do Mel, que fica perto de Mossoró, seria a ideal, mas eu raciocinei que lá eu encontraria talvez muitas pessoas com quem tive uma comunhão macabra no uso dessa droga terribilíssima. Então decidi me tratar na unidade da Fazenda Santa Rosa, em Garanhuns, no estado de Pernambuco.
OM: As companhias influenciam ou a pessoa só entra no mundo das drogas se quiser?
José Romero Araújo Cardoso: É uma decisão de cada um. Só que a curiosidade é algo inerente ao ser humano, em querer experimentar algo que você não conhece. E no meu caso pessoas, escritores conceituados que usavam maconha, era uma espécie de modelo, de exemplo a ser seguido naquele momento.
Você está se lançando no meio cultural e se fulano faz porque você não vai fazer. Então a partir disso, vendo muitas pessoas ligadas à cultura se drogar eu acompanhei.
OM: Que tipo de drogas o senhor usou?
José Romero Araújo Cardoso: Usei maconha e crack, porque nunca me dei com a cocaína. Tentei usar cocaína em Cajazeiras, mas não senti nenhum prazer. Não tive experiências com outras drogas mais pesadas, mas a droga que leva ao fundo do poço é o crack, que precisa ser banida da face da Terra.
OM: O que o senhor buscava no uso dessas substâncias, qual a sensação que elas proporcionavam?
José Romero Araújo Cardoso: A maconha me dava uma sensação de bem-estar, me fazia mergulhar em um mundo desconhecido que era algo inexplicável, uma sensação agradável. Com relação ao crack não tinha mais a questão do prazer, era dependência mesmo porque é uma droga avassaladora.
Vi coisas muito graves em decorrência dessa droga, contadas pelos meus irmãos da Fazenda da Esperança, que me fizeram rever todos os meus conceitos e valores, porque eu tenho a convicção de que sou uma pessoa boa e não quero contribuir para a infelicidade de ninguém então o que eu ouvi desses irmãos, mudou radicalmente a minha vida. Ouvi coisas gravíssimas, de pessoas que roubaram e mataram por causa dessa droga para saciar o vício.
OM: Como era o seu relacionamento com a sua família?
José Romero Araújo Cardoso: Sempre foi normal, eu nunca causei problemas para ninguém porque o meu temperamento é calmo, não é agressivo, mas eu notava minha mãe, velhinha, sucumbindo em razão de me ver me destruindo com o consumo sôfrego de droga, um consumo adicto mesmo de droga que vinha me debilitando física, moral e psicologicamente.
Aonde eu ia chegar eu não sei, mas quando eu vi que o fundo do poço era o meu caminho eu resolvi parar, eu resolvi procurar ajuda. Resolvi seguir o que aquela voz que vinha na minha mente mandando eu me tornar um homem novo. As pregações do pastor Anselmo, que só descansou quando conseguiu me convencer, estão intimamente relacionadas ao agir de Deus em minha vida.
OM: Hoje, em fase de recuperação, tem alguma coisa que o senhor perdeu que não tem como recuperar?
José Romero Araújo Cardoso: O passado passou, eu não penso nisso. A minha vida eu entreguei nas mãos de Deus, eu não me preocupo mais com o que eu perdi ou que deixei de ganhar. Isso aí não me interessa. O que me interessa é que a minha meta é me tornar um homem novo e o meu objetivo de vida agora é levar o amor a todos os meus semelhantes. O amor de Deus, que é o único que salva, não tem outro.
OM: O senhor passou um período na Fazenda da Esperança Santa Rosa e pretende usar as experiências que vivenciou para ajudar a salvar outras pessoas. Como pretende fazer isso?
José Romero Araújo Cardoso: Deus vai encaminhar tudo bem direitinho, eu não vou me precipitar, tenho certeza de que aparecerão pessoas que comunguem o meu ideal a fim de viabilizar esse pleito. Confio plenamente que Deus agirá no sentido de que isso tudo seja concretizado, porque eu aprendi muito na Fazenda da Esperança, sobretudo no que diz respeito a respeitar o tempo de Deus.
OM: O senhor agradece a Deus por estar conseguindo se libertar desse problema. Como era a sua relação com Deus e o que mudou depois dessa fase?
José Romero Araújo Cardoso: Já existia o contato, sou de uma família que uma parte é católica e a outra parte é evangélica. Eu sempre estive em contato com a palavra de Deus, mas às vezes você se torna rebelde em razão, por exemplo, de leituras, uma que me marcou muito foi Marx Webber em "A ética protestante e o espírito do capitalismo", eu sempre pensava que os evangélicos estivessem a serviço dos banqueiros suíços, dos industriais alemães e o objetivo seria alienar.
Eu tinha a certeza de que Deus tem um amor infinito, mas tinha muito relutância em relação às religiões. Parte da minha família é descendente de judeus e eu sempre trouxe uma certa revolta por que a igreja através da inquisição matou muitos familiares meus, mas sempre tive a convicção de que Deus é a força maior do universo.
OM: Qual a importância da espiritualidade para a transformação de vida de quem sofre com esse mal?
José Romero Araújo Cardoso: Toda a importância. A espiritualidade é essencial no sentido em que permite que nos relacionemos de forma coerente com o nosso semelhante, permite um contato maior com os desígnios de Deus. É impossível alguém pensar em seguir uma vida normal sem dimensionar a importância da espiritualidade.
A palavra de Deus é tão importante que eu poderia até usar uma resposta de Cristo a Nicodemos, um príncipe judeu que indagava a Cristo sobre o que fazer para mudar. Você tem que nascer de novo, essa foi a resposta de Cristo. Nascer de novo como? Entrar no ventre da mãe e vir ao mundo novamente? Não.
Você nasce de novo mudando seus hábitos e concepções. Você nasce de novo, justamente, incutindo uma nova mentalidade a cerca de suas relações com as pessoas, de seus objetivos de vida. Porque isso aqui é uma passagem, isso aqui não é permanente, não é infinito.
Então acima de tudo você tem que saber que para conseguir esse intento, o reino de Deus, você tem que se arrepender de tudo que você fez e buscar novos caminhos, e ter amor a Deus sobre todas as coisas e amor pelo seu próximo.
OM: Aqui na cidade algumas pessoas vêm levantando essa bandeira de combate ao uso de drogas e apoio às pessoas que procuram se recuperar. Qual a importância do trabalho dessas pessoas?
José Romero Araújo Cardoso: É um trabalho que não tem condições de você dizer qual é a importância porque é extraordinária. Porque o mundo está sendo contaminado por uma droga que tem muito do inimigo, que está tomando uma dimensão pandêmica. Então se não houver uma conscientização, se não houver ajuda de pessoas que tenham vontade de buscar contribuir para erradicar esse mal da face da terra eu não sei o que será do futuro da nossa sociedade.
O futuro é incerto em razão dessa droga apocalíptica, e já me disseram que existe uma nova droga chamada oxy, que é pior do que o crack. Então a única coisa que eu posso dizer é que obrigado meu Deus por iluminar pessoas de bom coração que estão contribuindo muito.
Eu devo demais ao pastor Anselmo e não sei como pagar pelo que ele fez e se preocupou comigo, pelas pregações, a insistência, a paciência, porque foi difícil, já que eu estava tão envolvido com essa droga que mesmo sentindo o espírito deixar meu corpo, porque eu estava morrendo, eu não estava querendo me recuperar.
OM: Quais locais aqui na cidade que oferecem apoio às pessoas que necessitam de tratamento?
José Romero Araújo Cardoso: O primeiro passo é entrar em contato com o Grupo Esperança Viva, tem também o Betel, a Fazenda da Esperança ligada à Igreja Católica, o Desafio Jovem. Além dos narcóticos e alcoólicos anônimos, porque uma vida boa é uma vida sem nenhum tipo de drogas.
OM: Qual o conselho que o senhor deixa para as pessoas que têm curiosidade em experimentar esse tipo de substância para saber como é?
José Romero Araújo Cardoso: Desistam, não vale a pena, nunca queira saber o que é ser escravo de uma droga poderosa como o crack. Resistam, não queiram saber como é triste a situação de uma pessoa submissa a essa droga violenta. Eu agradeço a Deus pela oportunidade que ele está me dando de me recuperar e eu peço a todos que não queiram saber dessa droga, que causa um mal tremendo, é violenta e que só vai prejudicar em todos os sentidos.
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